segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Notícias fresquinhas...

Essas aqui são notícias fresquinhas, do 'Dylan Examiner', e nós, dylanescos, ansiosamente esperamos que se confirmem. De acordo com Harold Lepidus, um sujeito sempre muitíssimo bem informado em matéria dylanesca, estão previstos alguns lançamentos de Bob Dylan, num futuro próximo. São eles:
1. 'Blood On The Tracks - Sessions', o 'alternate', das sessões de Nova York.
2. CD/DVD dos 'Supper Club Shows', de 1993
3. A chegada das 'Bootleg Series' ao formato DVD, incluindo de forma oficial, o especial de TV 'Hard Rain', de 1976.
4. Um documentário sobre a 'Rolling Thunder Revue'.
5. Um possível 'box set' com as 'Blonde On Blonde - Sessions'.
Ainda não há nada confirmado e as informações acima não são oficiais. Por enquanto, sabemos apenas do lançamento do compacto (Duquesne Whistle - 2012 Record Store Day - Black Friday Release 7-inch), que como podem ver, faz parte da chamada Black Friday do evento internacional 'Record Store Day', trazendo de um lado a própria "Duquesne Whistle", e do outro, "Meet Me in the Morning" (unreleased version). Será uma edição limitada a 5.000 cópias e estará à venda nas lojas independentes dos EUA, a partir de 25 de novembro deste ano...

De todo modo, é ficar numa grande torcida pra que a notícia (ou pelo menos, parte dela) se confirme e possamos adicionar às nossas prateleiras, essas verdadeiras preciosidades!

sábado, 15 de setembro de 2012

Bob Dylan e a Tempestade

O amigo dylanesco Miguel Cordeiro, consegui captar de uma forma bem particular, a essência de 'Tempest', álbum de Bob Dylan, recém-lançado, com seu desenho sobre papel e um belo texto, que reproduzimos abaixo, no qual faz uma breve resenha do novo disco do velho bardo!

Bob Dylan e a Tempestade
A resposta que soprava com o vento que Bob Dylan falou no início da década de 1960 era uma brisa de esperança em uma época que ainda restava hipóteses de fraternidade universal. Mas agora, ao lançar o álbum Tempest, o poeta roqueiro da contracultura vocifera um amontoado de dúvidas sobre um mundo violento, desesperançado, envolto por tempestades sem previsão para acabar e nem sinal de bonança no horizonte.
Aos 71 anos de idade, o artista Dylan continua em plena forma. Algo quase impossível de se pensar para um astro da música popular que iniciou carreira há cinquenta anos atrás. E se sua voz soa desagradável para os apreciadores do bel canto, ela se encaixa como uma luva para aquilo que ele se propõe a dizer. As palavras emergem das catacumbas da alma na melhor tradição dos velhos blueseiros.

Sua poesia musicada está tão afiada quanto nos melhores tempos, porém enxuta, com versos curtos e menos discursivos. As imagens que surgem de Tempest falam de cadáveres arrastados na lama, feridas abertas em sangue, políticos que mijam nas pessoas, reis que destroem cidades e indivíduos, vinhos envenenados, o desespero dos náufragos do Titanic, e os tiros que mataram seu amigo John Lennon.
A sonoridade de Tempest segue o padrão que Dylan estabeleceu para sua criação a partir de Love and Theft, álbum de 2001. Rocks básicos, blues, folk e o cancioneiro pré-rock´n´roll dos anos 1930 e 1940. Nada de influências moderninhas, nenhum acorde de guitarras distorcidas simuladas através de processos digitais que se tornaram padrão no rock marqueteiro do hype dos últimos quinze anos.

Tudo em Tempest é propositalmente elaborado para estar do lado oposto ao que existe na cena da música pop atual. A coisa é crua, feita na mão, na unha. E apesar do clima sombrio e apocalíptico que as canções evocam, Dylan e sua fantástica banda de apoio parecem se divertir enquanto executam a trilha sonora destes dias malucos. Até parece a orquestra do Titanic nos momentos finais.

Quem quiser conferir um pouco mais da arte de Miguel, segue o link: http://www.miguelcordeiroarquivos.blogger.com.br/index.html

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Tempestade na alma!

Uma semaninha antes do seu lançamento oficial e eis que 'Tempest', novo álbum de Bob Dylan, vazou na internet. Uma pedrada dylanesca! Um dia após o vazamento, a Sony tratou de disponibilizar oficialmente o álbum, para audição gratuita, através do iTunes.

Confesso que estou embriagado de 'Tempest'! Desde ontem à noite (03/09, quando o disquinho vazou) que não escuto outra coisa. Diria até que após sucessivas audições, já tenho inclusive minhas preferidas: "Narrow Way"; "Pay in Blood" & "Duquesne Whistle", mas os amigos dylanescos não devem levar isto tão a sério, porque hoje mesmo pode mudar. Em se tratando de Dylan, sou extremamente volúvel e às vezes demoro um pouco pra me acostumar com algumas canções.

A faixa título, "Tempest", a tão aguardada canção sobre o naufrágio do Titanic, é uma verdadeira epopeia de quase 14 minutos! Poderia mesmo ser um filme, mas daqueles antigos, talvez em preto & branco, sem os efeitos especiais do James Cameron.

Abaixo, mais uma excelente contribuição do amigo dylanesco Márcio Grings, que nos permitiu compartilhar sua ótima resenha do novo disco:

Tempestade na alma!

Resenha de "Tempest", 35° álbum de Bob Dylan (04 de setembro de 2012) - Com comentários, impressões e citações extraídos da comunidade do Facebook ‘Bob Dylan -  Brasil’ (Agradecimentos: Doofy Mostarda, Sergio Pinho Alves, Carolina Andrade, Thiago Joey, Fábio Feldman, Thiago Ramires, e muitos outros dylanescos de plantão. Agradecimento especial: Denise B. Lopes)
O navio nem atracou, e o disco já está navegando. Em primeiro lugar: aos 71 anos, ninguém, mas ninguém mesmo - toca Dylan como Dylan. E falo principalmente das canções dos últimos três álbuns – não incluindo o natalino “Christmas in the heart” (2009). Colocando no saco as novas músicas que acabam de vazar na rede, os 10 temas também foram compostos sob medida para a irregular voz catarrenta do cantor e compositor norte-americano.

E mais: profetizo sem medo de errar: ”Tempest”, álbum com data agendada para o próximo dia 11/09, sem dúvida irá postular em todas as listas dos melhores de 2012. Depois de vazar por inteiro na internet na última segunda-feira (03), a Sony resolveu disponibilizar o álbum na íntegra para audição (gratuitamente e por tempo limitado).


O título já é o recordista do ano no quesito pré-venda no site Amazon. Sobre o nome do álbum, especulou-se que seria uma referência à “A Tempestade”, última obra de William Shakespeare. Dylan laconicamente refutou a referência em entrevista à revista Rolling Stone.  Agora prepare-se - as letras estão sim - shakesperianas e quilométricas: amor, tragédia, traição, vingança, e tantos outros temas comuns à humanidade a milênios.

Segundo o blog Dylanesco, a imagem da capa mostra um detalhe da fonte Palas Atena, localizada em Vienna, Áustria. Atena é, na mitologia grega, a deusa da guerra, da civilização, da sabedoria, da estratégia, das artes, da justiça e da habilidade. John Smith, um morador de Duluth, onde Dylan nasceu, afirmou no Facebook que na escola da cidade havia uma estátua parecida.
O bardo gravou o álbum no Groove Masters, estúdio de Jackson Browne, em Santa Monica (CA), com a banda que atualmente o acompanha na estrada (mesma trupe que passou pelo Brasil em abril), mais a ajuda de David Hidalgo (Los Lobos). O disco foi produzido por Jack Frost, ou seja, pelo próprio Bob Dylan, já que Frost não passa de um alter ego do artista.

“Tempest” começa com a satírica “Duquesne Whistle" e sua introdução foxtrote em fade-in que nos deixa com a sensação de estarmos ouvindo um radinho de pilha ao longe, como um som opaco vindo da cozinha. Piano, violão e guitarras fazem um empolgante esquenta ‘jazzy’ de 43 segundos. Na sequência surge uma melodia repetitiva empurrada pela pulsação do contrabaixo acústico de Tony Garnier, em conjunto com a bateria de George Receli e a guita' rítmica de Stu Kimball e supostamente David Hidalgo. Dylan canta “You say I’m a gambler / You say I’m a pimp / But I ain’t neither one” [Você diz que eu sou um jogador / Você diz que eu sou um cafetão / Mas eu não sou nenhum desses]. A banda soa como uma velha locomotiva passeando num desenho animado. “Duquesne Whistle” ganhou vídeo clipe e também foi escolhida para figurar como primeiro single do álbum.
“Soon After Midnight” reza na cartilha country. Também rememora Buddy Holly, parece algo familiar, antigo e deslocado no tempo. Steel guitar mandando ver, entrecortado por uma guitarra à lá James Burton. Dylan avisa que logo depois da meia noite, ele irá se encontrar com a Rainha das Fadas. "Charlotte's a harlot / Dresses in scarlet / Mary dresses in green  / It's soon after midnight / And I've got a date with the Fairy Queen". Hummm... Isso me soa a um puteiro!

“Narrow Way" é um hipnótico blues pesado com riff de guitarra repetitivo que nos deixa em ponto de bala. A música nunca muda, e isso, acreditem - não é irritante! 7min e 28seg de pura festança, no máximo uma guitarra gritando um pouco mais alto que a outra. Como galos de rinha reconhecendo o terreno e mostrando as esporas. Logo no início ele diz: "I won't even think about what I left behind" [eu não vou nem pensar naquilo que deixei para trás]. Quando estamos no meio do caminho, não tem outro jeito. Receli dá show na bateria. Alguém disse que “Narrow Way” poderia ter sido gravada em 1965, quem sabe seria uma boa faixa em “Bringing It All Back Home” ou “Highway 61 Revisited”? Não tenho dúvida que entrará nos setlists de suas apresentações. Outra constatação: acredito que Dylan tenha encontrado sua melhor banda, ou no mínimo a que mais raciocina na sua batida atual.

“Long and Wasted Years” trata-se de outro tema chamuscado com influência caipira. Na introdução, os músicos atuam como uma banda de quermesse com equipamentos de segunda mão. Quando Dylan canta, o lance fica mais sofisticado. Dá vontade de “tirar” a prenda e sair dançando de rosto colado pela casa. A melodia lembra “I'm Tired Joey Boy”, de Van Morrison, tema que Dylan tocou no ‘Theme Time Radio Hour’, seu extinto programa de rádio. Outra balada de lascar! A letra sugere um amor proibido. Em dado momento, Dylan confessa: "I wear dark glasses to cover my eyes / there are secrets in them i cant disguise” [Eu uso óculos escuros para cobrir meus olhos / Há segredos neles eu não consigo disfarçar].  Revelador.
Se buscarmos comparações com "Love & Theft, álbum lançado em 2001 (um dos preferidos de Bob), eis a "Mississippi" de "Tempest". "Pay in Blood" tem o vocal catarrento e desgastado, tipo “recém acordei, fumei um charuto e vou cantar uma canção!?!?”. Desde já é minha preferida. Eu percebo resquícios de Stones nas guitarras, e nesse caso, abriria um exceção imaginando Keith Richards como vocalista. Imaginem como iria ficar? Finésse!
Bom, chegamos em “Scarlett Town”. Violão na linha de frente, banjo no meio campo, piano minimalista e violino a lá "Scarlett" Rivera. Uma triste bonita melodia que poderia ser trilha sonora de um faroeste de Sam Peckinpah (eu já vi esse filme?!). A canção lembra vagamente o clima sombrio de “Nettie Moore”, de ‘Modern Times’. E essa “Scarlett Town” que Dylan nos narra, pode ser qualquer pequena cidade do mundo. Em uma de minhas audições, voltei ao bairro, a rua, relembrei muitas pessoas com as quais convivi. Quando adentramos o cerne do tema, Bob SEMPRE nos convence.

“Early Roman Kings” não passa de um blues descarado, encardido que emula “I'm a Man”, de Bo Didley. "Mais uma daquelas que o velho pega emprestado". Exato! Dylan aprecia recauchutar canções antigas. Algo que ele fez com mais frequência nos últimos álbuns. E esses empréstimos melódicos são comuns na história do blues. Como bem lembrou o amigo Sérgio P. Alves no Facebook: “I'm a Man” também foi inspirada em “Hoochie Coochie Man”, de Dixon. Por sua vez, serviu de ponto de partida para a criação de “Manish Boy”. Ou seja, ninguém é de ninguém. Destaque para o acordeão de David Hidalgo, fazendo as vezes de Little Walter e transformando  a música numa espécie de Texmex Blues. Aparentemente, os “Roman Kings” a que se refere, não são os verdadeiros reis romanos de outrora, mas uma gangue nova-iorquina do início do século XX, formada, basicamente, por carcamanos.

“Tin Angel”, fala sobre um homem em busca de um amor perdido. Musicalmente é um dos pontos menos impressionantes do disco. De todo o modo, a banda fica apenas tique-taqueando e fazendo a cama para que o narrador possa contar uma das mais enigmáticas e trágicas histórias de amor da biografia dylanesca. Desde “Isis” ele não incursionava por um tema tão brutal: “You died for me / I’ll die for you". [Você morre por mim / E eu morro por você]. Ela coloca a lâmina no seu coração e parte para a eternidade ao encontro do amante. E ao chegarem no céu, existem tochas brilhantes que iluminam noites e dias. Alguém tem dúvida que Dylan é o Shakespeare da música POP?
“Tempest”, a faixa título do trabalho, emula uma das tragédias mais lembradas do século passado, o naufrágio do Titanic. O tema parece ter sido inspirado em uma canção da Família Carter. Essa autêntica epopeia dylanesca em ritmo de valsa, que começa puxada por uma rabeca e acordeão, figura entre as três canções mais longas do compositor (13min e 54seg) e mistura uma série de personagens obscuros com nomes ligados ao tema cinéfilo do filme, como o ator Leonardo Di Caprio (mencionado duas vezes). No entanto, esqueçam qualquer referência a James Cameron ou Celine Dion, o lance aqui é ancestral, remonta a uma antiga canção de ninar folclórica.

“Tempest” fecha as cortinas homenageando John Lennon. “Roll on John” saúda o velho amigo e narra episódios da carreira do Beatle, com direito a citações de “A Day in the Life” cruzando frente a versos de William Blake. "From the Liverpool docks to the red-light Hamburg streets / Down in the quarry with The Quarrymen / Playing to the big crowds, playing to the cheap seats / Another day in the life on your way to your journey then". Novamente steel guitar, violões, um banjo rolando de leve. Belo tributo ao mais turbulento dos Fab Four.
Simplesmente o Melhor Álbum de 2012. Na minha estante ficará lado a lado com "Time Out of Mind", "Love & Theft" e "Modern Times". Daqui há 20 ou 30 anos, tenham certeza, ainda vamos falar de "Tempest" e das profecias incrustadas nas letras. Afinal: "Se a Bíblia estiver certa o mundo vai explodir". Certas vezes ficamos com medo das turbulências que entortam em frente nossos olhos. Eu afirmo: - nada como uma tempestade dessas para nos deixar encharcados de júbilo.

por Márcio Grings, originalmente publicado no Blog do Grings:

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

O que já sabemos sabemos sobre “Tempest”.


Estamos entrando no finalzinho de agosto e a ansiedade pela chegada de setembro, e com ele o lançamento de ‘Tempest’, novo álbum de Bob Dylan, só vai aumentando... Aqui, o amigo dylanesco Fábio Feldman, fala das suas expectativas e de tudo aquilo que já sabemos antecipadamente sobre o 35º disco de estúdio do bardo. Vamos ao texto:

Daqui a duas semanas (50 anos e seis meses após o lançamento de seu álbum de estréia), o verdadeiro Mr. Jones lançará seu trigésimo quinto disco, "Tempest". Como não paro de pensar nisso um minuto, segue uma breve compilação que fiz de algumas coisas que já sabemos sobre essa tempestade perfeita: 

1. O disco terá 10 canções, será produzido por Bob Dylan/Jack Frost, contará com a genial banda que o tem acompanhado ao longo dos últimos anos + eventuais acordeons de David Hidalgo (Los Lobos) e, sem sombra de dúvidas, será incrível!  
2. A canção homônima, inspirada em “The Titanic”, da Família Carter, parece ser uma mini-epopéia dylanesca – cruzamento entre “The Wreck of Edmund Fitzgerald” e “Desolation Row”, narrando o mais famoso naufrágio de todos os tempos. Ao mesmo tempo em que considerações mais gerais são tecidas sobre o evento, as reações de uma série de diferentes personagens são representadas: um tal de Wellington se tranca numa cabine; Jim Backer olha a morte nos olhos, resignadamente; Davy, o cafetão, se livra de suas garotas à medida que a água sobe; e Leo (DiCaprio?) é mencionado duas vezes, fazendo sabe-se lá o quê. Trata-se de uma valsa, em tempo ternário, e já figura entre as três mais longas composições de Dylan, possuindo 14 minutos. 

3. “Tin Angel” é outra canção bem extensa: 9 minutos. Parece narrar uma história alucinante de vingança, seguindo a tradição lírica das murder ballads do cancioneiro tradicional americano. A mulher do “Chefe” foge com outro. Em um cenário que remete ao universo dos westerns americanos, ele vai atrás dela, arrastando consigo um rio de sangue! Um crítico menciona Walter Hill e Gregory Peck; eu espero por Sam Peckinpah.

4. Muito foi dito sobre as outras faixas, mas as informações não batem 100%. Alguns apontam “Long and wasted years” como uma balada doce, ainda que levemente desencantada; há quem diga que lembra “Three angels” de "New Morning", com seu canto-falado. “Pay in Blood” me chama a atenção mais do que qualquer outra! Como não salivar diante de versos como “You bastard, I’m supposed to respect you?/ I’ll give you justice”? Só imaginar aquela voz ancestral grunhindo “Eu pago em sangue – mas não o meu!” já é o suficiente pra deixar qualquer dylanmaníaco subindo pelas paredes! 
5. A faixa que fecha o álbum, “Roll on, John”, embora inspirada num antiga balada folk, é uma homenagem a John Lennon. Menções a William Blake também ocorrem. Dizem ser a mais terna composição de "Tempest" – e, possivelmente, um fechamento perfeito! 

6. Duas canções completas e o trecho de uma terceira já vazaram na net. A primeira é “Early Roman Kings”, um blues da pesada, marcado por um riff tradicional, chupado de Muddy Waters/Willie Dixon. A voz de Bob cai como uma luva e a letra – bem, a meu ver, é melhor do que todas as de "Together Through Life" combinadas! Aparentemente, os “Roman Kings” a que se refere, não são os verdadeiros reis romanos de outrora, mas uma gangue novaiorquina do início do século XX, formada, basicamente, por italianos. É interessante destacar o modo ambíguo como tais “valentões” são representados, rolando aquela oscilação que caracteriza os filmes de máfia, nos quais membros da “Família” são vistos, simultaneamente, como heróis e vilões. Mesmo sendo “lecherous and  treacherous”, vivendo como vampiros – enfiando suas estacas e deixando rastros de fogo atrás de si – eles são também figuras desejadas (e invejadas) pela maioria. Essa ambiguidade é intensificada ainda mais quando, na quarta estrofe, a terceira pessoa dá lugar à primeira e somos forçados a nos colocar diretamente sob a pele de um gangster! Embora não seja novidade dentro do universo das composições dylanescas (pensemos em canções como “Man in the long black coat” e “Ballad of Hollis Brown”), tal operação brechtiana de alteração de perspectivas me parece, aqui, atingir um pico qualitativo ímpar. Somos, simultaneamente, vítimas e algozes em um mundo em ruínas (mundo este que, concentrado no interior das paisagens mágicas de Dylan, onde todas as barreiras do tempo são subtraídas, pode muito bem ser o nosso…).


7. A faixa de abertura, “Duquesne Whistle”, é um nocaute! 42 segundos de uma bela introdução instrumental (algo inédito em toda a discografia do bardo), são marcadas por  guitarras se metamorfoseando em clarinetes e nos transportando de volta pra os loucos anos 20. A letra é ainda um pequeno enigma. Há quem a conecte a Earl Hines, um dos pais do piano jazzístico, nascido e criado em Duquesne. Ontem, descobri o seguinte link, contendo a partitura de uma obscura canção folk tradicional, chamada “The wreck of the flyer Duquesne”:


Não a conheço, logo, é preciso checar bem antes de fechar qualquer conexão. De qualquer modo, a letra, co-assinada por Robert Hunter, é repleta de momentos luminosos. Agridoce, plena daquela suave melancolia que atravessa os melhores momentos da trinca Love and theft/Modern Times/Together Through Life, ela nos conduz a cenários antigos, enquanto, num passeio de trem, o eu lírico sofre de amores por uma misteriosa “dark lady” – ao mesmo tempo, dissimulada, fria e doce como a mãe de Jesus Cristo. É a musa do Dylan fase-Frost – aquela que nasceu no Mississipi, atravessou as canções de Charley Patton, dançou entre os cães infernais de Robert Johnson e carrega a herança popular americana inteira nas costas.

http://www.youtube.com/watch?v=vANZ-GGaOC0

 http://www.youtube.com/watch?v=V2r5C-t4naw

8. Além dessas duas pérolas, fomos presenteados com 58 segundos de “Scarlet Town”, uma bela balada folk que me pareceu uma mistura de “Ain’t talkin’” e algo saído de dentro das "Basement Tapes". Porém, embora seja cedo pra dizer algo de mais definitivo sobre ela, dylanólogos de plantão já detectaram a raiz da canção: Dylan andou lendo poesia romântica americana – em especial, a de John Greenleaf Whittier, de quem tomou de empréstimo algumas imagens iniciais:
Dylan:
In Scarlet Town, in the hot noon hours,
There’s palm leaf shadows and scattered flowers
Beggars crouching at the gate
Help comes, but it comes too late.

Whittier. Extraído de “To Avis Keene”:
The palm-leaf shadow for the hot noon hours,
And on its branches dry
Calls out the acacia’s flowers

Dylan:
By marble slabs and in fields of stone
You make your humble wishes known,
I touched the garment, but the hem was torn
In Scarlet Town, where I was born.

Whittier. Extraído de “The Wish Of To-Day”
But, bowed in lowliness of mind,
I make my humble wishes known;
I only ask a will resigned,
O Father, to Thine own!

Como diria Picasso: - “Bons artistas copiam, grandes artistas roubam”!


9. Pra fechar, Dylan confidenciou à Rolling Stone que sua idéia era criar um álbum de canções religiosas, mas a coisa saiu dos trilhos e "Tempest" surgiu no lugar. Não se sabe, exatamente, o que ele quer dizer com “canções religiosas” a essa altura do jogo. Estaria ele pensando em algo próximo da trilogia oitentista – em especial, o altamente sub-valorizado "Saved"? Ou estaria o compositor sonhando com novas formas de expressar sua devoção religiosa? Tá aí algo que nunca saberemos.

O curioso é que, não conseguindo fechar um conjunto de músicas gospel, ele acabou criando o que muitos críticos têm apontado como o mais pesado de sua carreira! Como em "Time out of Mind", o clássico de 1997, há muita escuridão em "Tempest", ainda que, musicalmente, ele pareça ser bastante variegado, lembrando, até o momento, aquela pequena jóia enciclopédica que foi "Love and Theft".

Agora é esperar até o dia 11 de setembro e conferirmos a obra em sua totalidade.

Fábio Feldman

sábado, 18 de agosto de 2012

Tempest is coming...

Pois é, meus amigos Dylanescos. Tem novo álbum do velho Dylan no forno... Tempest, novo rebento do bardo, chega às lojas (pelo menos lá pras bandas dos EUA) no próximo 11 de setembro. Como todos já sabem, uma das músicas do novo disco já foi amplamente divulgada no You Tube. Trata-se de 'Early Roman Kings', que pode ser conferida neste link: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=KawJXM64xrQ e, ao contrário do que muitos possam pensar, não faz referências aos antigos reis romanos, mas sim a uma das gangues de rua de Nova York, do final do século XIX.

O disco foi produzido pelo próprio Dylan sob o pseudônimo Jack Frost e foi gravado em Los Angeles, com a banda que se apresenta com o músico em turnê: o baixista Tony Garnier; o baterista George G. Receli; os guitarristas Donnie Herron, Charlie Sexton e Stu Kimball; além da participação do guitarrista dos Los Lobos, David Hidalgo, que já havia tocado no disco de 2009 de Bob Dylan, Together Through Life, na guitarra, no violino e no acordeão. A faixa-título, de quase 14 minutos de duração, fala sobre o desastre do Titanic e cita até mesmo o ator Leonardo DiCaprio.

Por estes dias, um trechinho de outra canção de Tempest, vazou na internet. 'Scarlet Town' também já foi parar no tubo: http://www.youtube.com/watch?v=r6UM3XgeLfo

Ao mesmo tempo, começaram a surgir as primeiras resenhas do novo álbum. No fórum de discussões do site Expecting Rain, um fã argentino fez uma belíssima compilação daquilo que já foi publicado sobre o 'track list' de Tempest, que segue reproduzida abaixo, em inglês:

1. Duquesne Whistle
[LA Times] The folky sound of old-time country blues guitar licks quietly unfurl before the full band explodes into a driving big-beat rhythm as rollicking as the train ride the song explores. It also signals perhaps a greater focus on musical arrangements than Dylan fans have been accustomed to, with melodic flourishes and sharp rhythmic breaks accompanying his metaphor-heavy lyrics in a song that sounds apocalyptic and hopeful at once.
[Guardian] Tempest opens with the jaunty Duquesne Whistle, something like a more rambunctious Nashville Skyline Rag from the 1969 album. Complete with jamming organ and slick guitar licks (shades of Charlie Christian?), the whistle threatens "to blow my blues away".
[Mojo] It starts like some Bob Wills & His Texas Playboys' 1930s Western Swing thing, like an old song emanating from ancient radio ether, reminding us of Dylan's love for the roots of American music. But after a verse, it hits ramming speed, kicking into a ferocious romping rocker propelled by Tony Garnier's walking bass. The conceit belongs to that grand tradition of long gone train line songs (think City Of New Orleans), representing older, more soulful values that get lost when progress mows down everything in its path. "Listen to that Duquesne whistle blow/Sounds like it's on a final run." A helluva an opener.

2. Soon After Midnight
[RS] The doleful "Soon After Midnight" seems to be about love but may in fact be about revenge.
[Billboard] "Soon After Midnight" is a bluesy doo-wop that echoes the Rays' "Silhouettes" and a bit of Santo & Johnny's "Sleepwalk" in an instrumental break.
[Guardian] It's a mood sustained in the gentle Soon After Midnight – "it's soon after midnight and I've got date with the fairy queen … and I don't want nobody but you" – on which some of Dylan's phrasing recalled for me the feeling of Under the Red Sky, the title track on the 1990 album.
[Telegraph] “I’m searching for phrases to sing your praises,” croons Bob Dylan on Soon After Midnight. [What sounds at first like a gentle country love song contains the admission “My heart is fearful / It’s never cheerful / I’ve been down on the killing floor” and concludes with the threat to drag the corpse of somebody called Two Timing Tim “through the mud”.]
[Mojo] At first one thinks this slow strut is a simple nocturne, a night owl's paean. But as the narrator moves through the moonlight, his multiple women become "harlots" and meet horrific ends. Bob The Ripper? As usual, nothing is revealed, only inferred. Wicked - even evil - delight.

3. Narrow Way
[Billboard] "Narrow Way" is a seven and a half minute riff-driven tune that straddles country and blues.
[Guardian] Narrow Way does carry notes of foreboding, heightened by a line about the British burning down the White House, but since when can you hear Bob Dylan singing about a having "a heavy stacked woman with a smile on her face" and not laugh, too?
[Telegraph] On the Muddy Waters style, harmonica-driven blues of Narrow Way, Dylan declares “this is a hard country to stay alive in / I’m armed to the hilt.”
[Mojo] A jump blues 'bout wimmin troubles. The put-down artist who sang "You're an idiot, babe/It's a wonder that you still know how to breathe," now scorns his lady with a withering "Even death has washed its hands of you." Best couplet: "I'm still hurting from an arrow that pierced my chest/I'm gonna have to take my head and bury it between your breasts."

4. Long and Wasted Years
[Uncut] The reflective mood of several other tracks, including stand-outs “Soon After Midnight”, “Long And Wasted Years” and “Pay in Blood” will no doubt recall for some the sombre cast of “Not Dark Yet”
[Mojo] A gorgeous ballad in which the protagonist apologises to his love for hurting her feelings. He admits he wears shades to hide his eyes because "There are secrets in them that I can't disguise" and in one line explains decades of Dylan photos.

5. Pay in Blood
[RS] The vengeful "Pay in Blood" has Dylan darkly repeating, "I pay in blood, but not my own."
[Billboard] The bite of Warren Zevon comes out in "Pay in Blood," the chorus of which ends with the gripping line "I pay in blood/but not my own."
[Guardian] The darkness does finally start to descend with the gospel-influenced Pay in Blood ("I pay in blood … but not my own" ).
[Mojo] A swaggering, threatening, don't-x-with-me and the second Tempest song where Bob plays the fiend. "Legs and arms and body and bone/I pay in blood but not my own."

6. Scarlet Town
[LA Times] There’s an ominous and mysterious tone to “Scarlet Town,” which adds another batch of colorfully named characters to the roster of Dylan song habitues: Uncle Tom, Uncle Bill, Sweet William, Mistress Mary and Little Boy Blue turn up on the streets of Scarlet Town.
[Billboard] Another song from the new album, "Scarlet Town" will play over the end credits of the first two episodes, which air Aug. 17. "Scarlet Town," rooted in English folk with banjo, acoustic guitar, fiddle and drums providing the accompaniment, plays out as a tale of doom, fate and potential redemption.
[Guardian] Scarlet Town – which is the setting for the Child Ballad Barbara Allen that Dylan has sung throughout his career.
[Mojo] We're in Masked and Anonymous territory here, Twenty-Worst Century amorality, where "the end is near," with "the evil and the good living side-by-side" and where "all human forms seem glorified." Perhaps he's referring to the Internet. A loping finger-pointer with a nice slow banjo plucked by Donnie Herron.

7. Early Roman Kings
[Billboard] A 12-bar blues that features David Hidalgo of Los Lobos on accordion.
[Telegraph] The throwaway blues of Early Roman Kings.
[Mojo] The only Tempest tune that's been officially YouTubed. As he's done in disparate songs from Bob Dylan's 115th Dream to Isis, the author erases boundaries between historical and mythical epochs and collapses time into Bobworld. Is this about Romulus? If so, he's wearing a sharkskin suit and there's talk of "ding dong daddies" and "Sicilian courts," all set to a Mannish Boy musical template.

8. Tin Angel
[RS] "Tin Angel" is a devastating tale of a man in search of his lost love.
[LA Times] The nine-minute “Tin Angel,” a remarkably straightforward ballad of romantic betrayal and retribution.
[Guardian] The slow-burning Tin Angel.
[Mojo] Full of betrayal and more pierced hearts, this is where Tempest sets up the first of the 1-2-3 punch of epic songs that close out the album. Ultra-violent, Shakespearean imagery in a description of a doomed love triangle that literally goes up in flames. To quote another rock poet, no one here gets out alive.

‎9. Tempest
[Uncut] The title track alone taking up a fair chunk of that, with verse following verse in a manner that might remind you of “Desolation Row”. The album’s title track, meanwhile, is a 14-minute epic that revolves around the sinking of The Titanic.
[RS] The title track is a nearly 14-minute depiction of the Titanic disaster. Numerous folk and gospel songs gave accounts of the event, including the Carter Family's "The Titanic," which Dylan drew from. "I was just fooling with that one night," he says. "I liked that melody – I liked it a lot. 'Maybe I'm gonna appropriate this melody.' But where would I go with it?" Elements of Dylan's vision of the Titanic are familiar – historical figures, the inescapable finality. But it's not all grounded in fact: The ship's decks are places of madness ("Brother rose up against brother. They fought and slaughtered each other"), and even Leonardo DiCaprio appears. ("Yeah, Leo," says Dylan. "I don't think the song would be the same without him. Or the movie.").
[LA Times] The devastating title track, a 14-minute epic that relates the history of the Titanic with greater power than James Cameron’s overstuffed film.
“Tempest,” couched as an old country waltz, finds Dylan (as he also does in “Tin Angel”) almost entirely avoiding the oblique imagery and playful metaphor on which he built his reputation as rock’s greatest songwriter, instead keeping his lyrics firmly planted on the ground -- or, in this case, in the frigid waters of the North Atlantic in 1912.
Yet every one of the song’s 45 verses still packs a punch. Here's one sample:
Mothers and their daughters
Descending down the stairs
Jumped into the icy waters
Love and pity sent their prayers
[Billboard] The song that will get the most attention though is the nearly 14-minute title track track. "Tempest," 45 verses written in accentual-syllabic verse with no chorus, is set aboard the Titanic, with characters ranging from an artist named Leo -- DiCaprio, one might assume -- to Jim Dandy, who hands over a chance at survival to youngster.
[Guardian] The title track, which lasts almost 14-minutes and tells the story of the sinking of the Titanic over the course of 45 verses. This last is a subject Dylan has touched on previously (in a line on Desolation Row), while several blues and folk songs have tackled it – Richard "Rabbit" Brown's Sinking of the Titanic and the Carter Family's The Titanic among them. Dylan told Rolling Stone his song evolved from fooling around with the melody to the latter, but what we end up with is something on a bigger scale. And just as the 16-minute Highlands from Time Out of Mind namechecked Neil Young and Erica Young, it's Leonardo DiCaprio who gets a mention here, among a cavalcade of characters.
[Mojo] The almost-14 minute title track about the sinking of the Titanic. The lords and ladies within initially dance before ending up as floating corpses. There's a character named Leo with a sketchbook, echoing the Hollywood version as well as history's. Some folks "slaughter" each other over lifeboat space, others perform great acts of heroism - a microcosm of humanity. And a mysterious character called "The Watchman" repeatedly dreams of the disaster and tries to save the victims. Is he on or off the ship? Is he contemporaneous or does he exist now? We're not told, adding to the surreal nightmare.

10. Roll On John
[Uncut] “Roll On John”, the album’s closing track, a wistful tribute to John Lennon that quotes lines from several Beatles songs, including “Come Together” and “A Day In The Life”.
[RS] Tenderness finally seals Tempest, in "Roll On, John," Dylan's heartfelt tribute to his friend John Lennon.
[LA Times] A 7 1/2-minute benediction directed at John Lennon, invoking several snippets of lyrics from the late Beatle’s songs.
[Billboard] The album's final track is a tribute to John Lennon, "Roll on John." In one verse Dylan references the Beatles songs "Come Together," Ballad of John and Yoko" and "Slow Down"; elsewhere on the ballad he combines the metaphysical with the historical.
[Guardian] Then finally, there's Roll on John, which digs back into the blues and into William Blake to tell part of the story of John Lennon; it's warm, mysterious and moving – and an excuse to dig out that famous footage of the pair in London taxi cab – with Dylan at one point singing: "I heard the news today, oh boy!" In terms of the Dylan canon, does it bring to mind the crepuscular menace of Not Dark Yet?. Perhaps it's more Forever Young.
[Telegraph] The album’s beautiful, surprising conclusion, Roll On John, is almost out of character, a shaggy, loose piano and organ lament for one of rock’s great dreamers, John Lennon. Dylan sings to his lost friend “your bones are weary, you’re about to breath your last / Lord you know how hard that bit can be” before breaking into an elegiac, bittersweet chorus (“Shine a light / Move it on / You burned so bright / Roll on John”).
[Mojo] And in the end, pretty much a blow-by-blow account of the murder of Dylan's friend John Lennon. Bob imagines the physical experience of dying that John endured in his final moments, down to "breathing his last." Terribly sad, terribly moving, and appropriate for all of us who consider Dylan and Lennon the titans of rock 'n' roll artistry - once two very stoned young pals in the back of a limo having too much fun. "You burned so bright/Roll on John."
Como os amigos puderam perceber, a maioria das críticas são extremamente positivas, o que só faz aumentar a ansiedade pelo tão aguardado lançamento. Dêem uma olhada na maneira como Michael Simmons encerra a resenha para a Mojo Magazine: "50 years after the release of his first album, Dylan remains our foremost storyteller. Thanks Bob."