segunda-feira, 15 de julho de 2013

'Another Self Portrait' saindo do forno...

Como já era esperado, o site oficial de Bob Dylan anunciou que o próximo volume (Vol.10) das 'Bootleg Series' é um conjunto de "alternate takes"; "demos" e versões "ao vivo" do período de gravações dos álbuns 'Self Portrait' e 'New Morning' (1969-1971).

O disco terá o subtítulo 'Another Self Portrait' e, assim como o álbum original, a capa também é assinada pelo próprio bardo.

As 'liner notes' serão do crítico Greil Marcus, aquele mesmo da resenha "Que Merda é Essa?" do lançamento original, além de raras fotografias e etc.

A versão 'standard' vem com CD duplo + libreto e a versão 'deluxe', além dos 2 CDs e libreto, trará +1 livro com fotos de John Cohen e Al Clayton e o melhor de tudo: 2 CDs com a apresentação histórica de Bob Dylan & The Band, "ao vivo" no 'Isle Of Wight Festival', 1969!


terça-feira, 2 de julho de 2013

Hora de celebrar: 45 anos de ‘Music From Big Pink’, da The Band!

Depois de nos brindar com um texto pra lá de bacana, sobre as 'Basement Tapes', de Bob Dylan & The Band, o amigo dylanesco Ismael Calvi Silveira nos presenteia com a celebração dos 45 anos de um dos melhores álbuns da história (o melhor?): 'Music From Big Pink', disco de estréia da The Band. Confiram:

Hora de celebrar: 45 anos de ‘Music From Big Pink’, da The Band!

Se na semana anterior estávamos celebrando os 38 anos do lançamento de Basement Tapes, a versão oficial das sessões de gravação entre Bob Dylan e The Band, hoje temos mais uma razão para comemorar. Neste dia, no aparentemente longínquo ano de 1968, chegava às lojas 'Music From Big Pink', emblemático disco de estreia da The Band que ajudou a reformular a música americana posterior a seu surgimento. O disco marca o início de um legado que ultrapassa a própria duração da banda, e isso pode ser visto através da idolatria de alguns músicos: Eric Clapton, Roger Waters e George Harrison, por exemplo, são fãs declarados tanto da Banda quanto do 'Music From Big Pink'. Isso é um belo indicador do que nos espera, não?

Há 46 anos atrás, reunidos com Bob Dylan em uma casa rosada próxima a Woodstock, em West Saugerties, Nova Iorque, tudo começava. Os então The Hawks já tinham trabalhado com a lenda Ronnie Hawkins e com o próprio bardo, embora apenas como banda de apoio; ou seja, a rapazeada já era escolada e tinha uma afinação bacana. Mas foi naqueles meses em que Garth Hudson, Levon Helm, Richard Manuel, Rick Danko e Robbie Roberson estiveram sob a orientação íntima de Bob Dylan, que a The Hawks se credenciou a abandonar aquele nome que representava a sua metafórica infância musical. O ritual de passagem estava completo e os cinco estavam aprovados: era hora de escolher o verdadeiro nome pelo qual eles seriam lembrados, o nome que representaria os homens nos quais eles haviam se tornado ao longo de meses de aulas práticas sobre folk, country e blues com o mestre Dylan.
A Banda pode soar um tanto presunçoso, mas é, no fundo, bastante certeiro e veio de uma forma natural. Como o Richard Manuel explicou no filme The Last Waltz, primeiro eles haviam tentado como “The Honkies” e “The Crackers”, mas a gravadora não aprovara os nomes (e, cá entre nós, fez um grande favor aos caras). Durante uma turnê com Bob, eles eram chamados de “the band” e, como todo apelido indesejado, acabou pegando. Assim, aclamados pela opinião pública desde a escolha do nome, era hora de gravar seu próprio material, digno do nome.

Em 1968, nosso grupo partiu de um material já pronto: três faixas que constam no álbum (“Tears of Rage”, “This Wheel’s On Fire” e “I Shall Be Released”) já haviam sido compostas nas sessões de 1967 com Dylan. Além dessas três faixas, há mais um cover, um clássico do country: “Long Black Veil”. De resto, foram compostas outras 7 canções para integrar a obra. “To Kingdom Come”; “In A Station”; “Caledonia Mission”; “We Can Talk”; “Chest Fever” e “Lonesome Suzie” são algumas acompanhantes de luxo do carro-chefe da banda: “The Weight” (que, como falamos no texto sobre o Basement Tapes, acabou virando sinônimo de algo genuinamente americano).
Unindo o legado dos tempos de Ronnie Hawkins com o treinamento dylanesco, Garth, Levon, Richard, Rick e Robbie criaram algo novo, único. Dali surge o tal do "roots rock", esse gênero significativo que, na verdade, é uma grande mistura de tudo. Há no som “inaugurado” em 'Music From Big Pink' uma união harmoniosa e orgânica de blues, R&B, soul, country e folk. De Curtis Mayfield ao próprio Dylan, muita gente serviu de base para esse espaço atemporal da música americana que é Music From Big Pink. Essa nova perspectiva, por exemplo, foi o que levou Eric Clapton a abandonar o Cream e procurar novas sonoridades junto do Blind Faith, e depois apoiando o duo Delaney and Bonnie ou mesmo formando o projeto Derek and The Dominos.

Robbie entrou com a maioria das letras (das originais do grupo, apenas “We Can Talk” e “Lonesome Suzie” são de autoria Richard Manuel) e com um trabalho de guitarra que, num primeiro momento, não parece se destacar tanto. Rick Danko (baixo), Richard Manuel (piano) e Levon Helm (bateria) também não fazem questão de se exibirem através de seus instrumentos. Na verdade, apesar de em termos ‘instrumentais’, ser Garth Hudson o verdadeiro gênio – e o som fulminante de seu órgão ser uma boa chave de entendimento do que é a The Band – é o conjunto da obra que impressiona. O absoluto clima de profunda amizade tira o fôlego, e a unidade do som parece operar com o funcionamento de uma família que se ama. Robbie, certa vez, disse que as músicas acabaram tão ‘redondas’ pelo fato de nenhum deles ser um grande músico – modéstia à parte, a verdade é que eles desenvolveram uma sinergia que representa muito bem como a música deveria ser, ao menos na minha concepção de música.

Por outro lado, se quase não há virtuosismo instrumental por parte dos membros da The Band, é difícil não ficar absolutamente embasbacado com os vocais. O jogo de vozes estabelecido entre Danko, Manuel e Helm é uma das coisas mais lindas que já ouvi por aí. Individualmente, cada um deles representa um tipo de vocal diferente – algo propício para a variedade de estilos e sonoridades que a banda abarcava -, mas juntos eles se tornam deslumbrantes. A voz de Richard é uma faca afiada e quente, usando um falsete lindo, ela desliza através dos corações como se fossem feitos de manteiga – acho que no rock há poucas vozes tão lindas. Já Rick é, normalmente, o mais descontraído dos três – ele costuma acrescentar um tom “brincalhão” às músicas, embora também seja capaz de emocionar. E Levon, talvez a figura paterna dessa família, traz autenticidade aos canadenses: como bom sulista, seu sotaque acrescenta um sabor especial ao seu vocal carregado. Ele é, acreditem-me, um artigo genuíno. Essa simbiose entre as vozes  é uma forte marca da banda. 
Apesar de todas essas qualidades e da admiração de alguns músicos importantes, “Music From Big Pink” não foi um sucesso instantâneo, todavia. As vendas começaram devagar, mas uma resenha muito elogiosa de Al Kooper na revista 'Rolling Stone' ajudou a chamar mais atenção para o surgimento da The Band. Em 1968, “Music From Big Pink” ficou na 30ª posição na lista de álbuns pop da 'Billboard', enquanto “The Weight” atingiu apenas a 63ª posição na tabela de singles 'Billboard Hot 100'. Por outro lado, a recepção foi um pouco mais calorosa no Canadá (35º lugar) e no Reino Unido (21º). O que, pelo que me parece, foi fundamental no alavancamento da The Band e do 'Music From Big Pink' ao sucesso foi a apresentação da banda no festival Woodstock em 1969 e a inclusão de “The Weight” no magistral filme "Easy Rider" (Sem Destino), também de 1969. Daí pra frente, ficou difícil segurar aquele pessoal. Em 2003, a 'Rolling Stone' elegeu “Music From Big Pink” como 34º melhor disco de todos os tempos, em uma lista com 500 álbuns.

Em 2008, no aniversário de 40 anos de 'Music From Big Pink', o disco recebeu uma edição remasterizada de luxo, com 9 faixas bônus. São elas: “Yazoo Street Scandal”; um take alternativo de “Tears of Rage”, “Katie’s Been Gone”; o cover de “If I Lose” (composta por Charlie Poole); “Long Distance Operator”; um take alternativo de “Lonesome Suzie”; “Orange Juice Blues (Blues For Breakfast)” (composta por Richard Manuel); cover do standard de blues composto por Big Bill Broonzy, “Key To The Highway”; e “Ferdinand the Imposer”.
O fato é que mesmo depois de passados 45 anos, “Music From Big Pink” permanece uma obra-prima da música norte-americana. Além de ter influenciado, como já falamos antes, Clapton, Waters e Harrison, o disco também ajudou a formar o gênero de roots rock. Aquele jeito, na época novo, de fazer o rock parecer velho, como se viesse de um tempo imemorial – alguma época de ouro perdida -, ainda é o exemplo mais bem acabado, na minha opinião, do benefício que essa viagem pelas raízes musicais de um país pode trazer ao rock. “Music From Big Pink” é uma aula sobre como fazer um disco: desde o conceito ‘orgânico’ das músicas, sem frescura ou exibicionismo gratuito, até à abertura da mente dos músicos para novas influências.

Por Ismael Calvi Silveira
Editor do site http://4oldtimes.blogspot.com e apresentador dos programas 4oldtimes e Expedição ao Rock na web radio www.radioputzgrila.com.br

Há 38 anos, chegava às lojas Basement Tapes, álbum de Bob Dylan e The Band

Mais um amigo dylanesco faz sua ‘estréia’, aqui no Blog Dylan: Ismael Calvi Silveira nos brinda com um ótimo texto sobre o álbum 'Basement Tapes', discaço de Bob Dylan & The Band. Vale conferir:

Há 38 anos, chegava às lojas Basement Tapes, álbum de Bob Dylan e The Band.
Dia 26 de junho foi dia de festa. Estamos todos nós, fãs daquilo que veio a se convencionar como "Americana", cheio de motivos para estarmos celebrando: na referida data se completaram 38 anos do lançamento de "The Basement Tapes", o registro oficial da primeira colaboração entre Bob Dylan e The Band, um encontro que mudaria o rumo da música norte-americana. Apesar de ter sido lançado apenas em 1975, as sessões que geraram "The Basement Tapes" ocorreram em 1967 e já circulavam, por baixo dos panos, como bootlegs. Vejamos, então, do que se trataram estas sessões e qual a importância deste disco chamado "The Basement Tapes".

Depois de uma extensa turnê mundial entre 1965 e 1966, apoiado pelos The Hawks (era assim que eles eram chamados antes de virarem The Band), Bob se encontrava cansado e havia caído em certa desgraça com seu público, que até o chamava de "Judas" por ter abraçado uma sonoridade mais próxima ao rock’n’roll. Quando retornou aos EUA, seu agente havia marcado mais inúmeras apresentações através do país, que acabaram sendo todas canceladas por um grande infortúnio. Em 29 de julho de 1966, Dylan sofreu um acidente de moto que mudaria tudo. Como o próprio bardo declarou, em entrevista cedida em 1969: "Eu tive um pavoroso acidente que me deixou fora da ativa por um tempo, e eu não percebi a importância daquele acidente pelo menos até ter se passado um ano. Eu percebi que havia sido um acidente real. Quer dizer, eu pensei que eu apenas me levantaria e voltaria a fazer o que eu fazia antes... mas eu não podia mais fazer isso".
Em sua casa, próxima a Woodstock, Dylan mudou seu estilo de vida durante o ano de 1967. Os Hawks foram chamados para comparecer à cidade para gravar com Dylan, e alugaram a Big Pink (casa que os rapazes tornariam famosa dois anos depois, ao lançar seu disco de estreia, “Music From Big Pink”). Nesse tempo que estiveram juntos, por vários meses, Dylan se reaproximou da música norte-americana de raiz e apresentou os caras da The Band a esse universo, já que até ali, eles eram estritamente músicos de rock. Entre a gravação de versões para antigas canções tradicionais e a composição de novos temas, uma certa sinergia surgiu entre mentor e alunos. O porão do Big Pink fornecia o pano de fundo caseiro, intimista, para o disco; a banda trabalhava para deixar Bob à vontade; e Dylan, por sua vez, destilava seu humor através da genialidade na composição. Havia algo ali de cunho bastante familiar, caseiro. E é disso que trata "The Basement Tapes" e os demais bootlegs: um ambiente rural, quieto e profundamente familiar.

É claro que o lançamento oficial, tão afastado das sessões originais, gerou polêmicas e controvérsias. A seleção de faixas, 24 ao todo, não representam todo o material composto em 1967 e, na verdade, tem 8 músicas que nem sequer contam com a participação de Dylan. De acordo com Robbie Robertson, principal responsável pela seleção das canções que entraram no álbum, isso aconteceu porque nem ele, nem Bob Dylan e nem Garth Hudson tinham acesso a todas as gravações originais. Criou-se um clima tenso, também, ao redor do disco: alguns críticos acreditavam que a inclusão das oito músicas da The Band era a forma de Robertson afirmar que o grupo fora tão ativo nas “Basement Tapes” quanto o bardo. Para os mesmos críticos, isso era um sacrilégio, já que as faixas da The Band "atrapalhavam a unidade do material de Dylan".

Mas polêmicas à parte, o álbum é, na minha singela opinião, sensacional. Há, nele, algumas de minhas canções favoritas da parceria Dylan/Band. "Goin' To Acapulco" certamente seria minha escolha primária, mas "Clothes Line Saga"; "Too Much Of Nothing"; "You Ain't Goin' Nowhere" e, é claro, "This Wheel's On Fire" não podem ficar muito pra trás. Acredito, inclusive, que essas canções servem muito bem para dar uma amostra geral da unidade do álbum. As temáticas mais frequentes foram o nada, sinalizando para o caráter descompromissado das sessões de gravação: eram apenas amigos se divertindo. E, nesse meio tempo, Bob Dylan pôde se reinventar e, também, se redescobrir. De certa forma, "The Basement Tapes" ia à contramão de outros álbums gravados em 67, como, por exemplo, o “Sargeant Pepper Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles. Como afirmou Bob em uma entrevista datada de 1978: "Eu não sabia como gravar da mesma forma que as outras pessoas fazem, e eu nem queria. Os Beatles tinham recém lançado Sgt. Pepper, que eu não curti nem um pouco. Achei ele um álbum bastante indulgente, apesar de as músicas neles seram realmente boas. Eu não achava que toda aquele produção fosse necessária."
 De qualquer forma, o que surgiu a partir disso foi o princípio de um novo jeito de se fazer (e mesmo de se pensar) música. Uma abordagem mais direta, sem tanta produção, que mergulhava em um universo ancestral de sonoridades que formaram a identidade musical norte-americana. "The Basement Tapes" e os outros bootlegs foram instrumentais na construção do "roots rock" e do "americana", eles materializaram um som tornado uníssono, que até então era uma multiplicidade enorme de estilos. Country, folk, blues... tudo foi jogado dentro do caldeirão, temperado com um rock suave e mexido até ferver e formar algo novo e único - algo genuinamente americano. E isso fica claro se nós dermos uma ouvida na discografia da The Band, por exemplo. Como explicou Joanna Colangelo, do site No Depression, no seu artigo "The Weight: Quando uma canção se torna um hino", o som da The Band, ou mais especificamente a canção "The Weight", representam a própria essência daquilo que é genuinamente americano.

Aquilo que foi alguns meses na vida de seis amigos acabou se tornando eterno na história da música. Horas de gravação se transformaram em um legado extenso de influência e de celebração. E é exatamente por isso que comemoramos hoje, 38 anos depois do lançamento da versão oficial daquelas gravações, as "Basement Tapes".

Por Ismael Calvi Silveira
Editor do site http://4oldtimes.blogspot.com e apresentador dos programas 4oldtimes e Expedição ao Rock na web radio www.radioputzgrila.com.br